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Política e Religião devem/podem se unir? Em entrevista, especialista comenta


Se os processos por campanha antecipada estão virando quase uma nova moda da política nacional, o controle nem passa perto de um importante centro da disputa presidencial deste ano: as igrejas. Para a professora Maria das Dores Campos Machado, especialista em voto e religião, é preocupante que não haja regras sobre promoção de candidatos nos templos.
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- Na mídia, o governo tem controle se está fazendo campanha ou não. Nem sempre você tem essa mesma possibilidade na igreja. A grande preocupação é a possibilidade de controlar a informação que se tem nesses espaços e ter alguns parâmetros para o que ali é feito.

Em entrevista a Terra Magazine, a socióloga da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) discutiu a importância dos grupos evangélicos nessas eleições. Dilma Rousseff, do PT, deve contar com o apoio da Igreja Universal do Reino de Deus. Já José Serra, do PSDB, tem se aproximado da Assembleia de Deus, que, acredita a professora, pode rachar nessas eleições.

Terra Magazine – Os evangélicos levam a religião mais em conta na hora do voto do que outros fiéis?
Maria das Dores Campos Machado – Não é que a religião seja levada mais em conta. No Brasil, a questão é: que tipo de evangélico está valorizando a participação política? Os evangélicos que estão mais envolvidos na política e que tem despertado mais atenção da mídia são os pentecostais. O que você tem de novidade é que os pentecostais, que até certo tempo, tinham uma visão mais distante com relação à política, de repente passam a repensar a participação política.

Esse interesse na política é recente?          
A partir dos anos 70 e 80 esses grupos começam a rever sua opção com relação a uma série de instituições. O surgimento de algumas igrejas mais contemporâneas como a Universal do Reino de Deus vai resultar num mimetismo por parte das outras. As outras ao vê-la tendo sucesso começam a rever suas posições e a tornarem-se mais flexíveis para atrair a classe média e outros grupos sociais. Então a política passa a ser um tema, como vai ser o futebol, uma série de outras instituições.

Mas então qual é a preocupação com os evangélicos nesse momento?
No caso dos evangélicos, esse interesse despertou um estranhamento na sociedade. Primeiro, porque são grupos vinculados às camadas populares. Nesse sentido, desperta uma preocupação com relação a que esses grupos populares são grupos que tem baixo nível de instrução. E, nesse grupo – a literatura da ciência política já aponta – a tendência é que a escolha ou a definição do voto seja feita em função de troca de informações ligadas à comunidade mais próxima. Então, se você não tem muita informação e se você transita em outras instituições, acaba que você define seu voto em função de poucas pessoas. No caso da igreja, o que se percebe é que essas pessoas acabam sendo influenciadas porque existe também uma autoridade espiritual. O próprio pastor está transferindo uma autoridade pessoal para o campo da política. Se ele indica alguém, o preocupante é a maneira como estes grupos evangélicos vêm estimulando a participação política em sujeitos que não tem outros espaços para comprovar a informação que está sendo transmitida ali.

Então esse estímulo dentro das igrejas pode ser perigoso?
Quando as igrejas assumem esse papel de divulgação e apoio de candidaturas – algumas tentativas até de organizar partidos políticos – você acaba transferindo párea esses espaços sociais, onde não se tem controle do que é feito, atividades que deveriam ser transferidas para um ambiente público, onde você tem controle. Na mídia, o governo tem controle se está fazendo campanha ou não. Nem sempre você tem essa mesma possibilidade na igreja. A grande preocupação é a possibilidade de controlar a informação que se tem nesses espaços e ter alguns parâmetros para o que ali é feito.

Você falou da Universal. Ela foi mesmo a primeira a se lançar na política?
Não é que é a primeira, mas ela é mais ousada. Ela tem se demonstrado mais ágil na abdução de algumas bandeiras dos movimentos sociais e algumas estratégias dos movimentos sociais. Ela tem se mostrado mais plástica, mais maleável no sentido de lidar com as diferentes tendências na sociedade. Ela tem sido uma ponta de lança.

Hoje há uma espécie de polarização entre a Universal e a Assembleia de Deus, não?
Pois é, se você pegar, a Assembleia de Deus é a igreja mais antiga do mundo pentecostal, ela e a Congregação Cristã do Brasil. A Assembleia de Deus é também a que tem mais fiéis, ela também tem uma bancada forte, mas sua participação é invisível, porque ela faz uma política sem grande alarde e não tem tanta plasticidade como tem a Universal. A Universal criou uma assessoria política muito antes das outras.

Essa atuação política dos pentecostais parece ter chegado primeiro ao legislativo e agora está fazendo diferença na eleição presidencial. Isso é novidade?
Não, desde o Lula isso tem sido forte. Várias candidaturas do Lula já tinham tido interferência das igrejas. A última eleição do Fernando Henrique Cardoso, os religiosos já estavam apoiando Fernando Henrique e com medo do Lula. Depois eles vão se virando mais para o PT. Mas isso tem sido muito forte desde a primeira vitória do Lula.

Você se arriscaria a dizer, hoje, o que é que tem mais influência: ter o apoio da Universal, como a Dilma tem, ou tentar jogar com questões da Igreja Católica, como o aborto?
Veja bem, os evangélicos eles são minoria ainda no Brasil como um todo, então a Igreja Universal é uma parte dentro desse mundo evangélico. Isso tem peso? Tem porque esses grupos são os grupos que ficam mais dentro dos indefinidos. Aqueles que resolvem seu voto em cima da hora e sem uma posição ideológica clara. Mas a Igreja Católica também tem um peso muito grande, principalmente nos movimentos sociais, movimentos sem terra. Então, não se pode falar qual que tem mais importância. O que eu acho interessante é que hoje você, além de ter que ter o apoio católico, você tem que ter o apoio evangélico. Isso não existia antes. Agora, os evangélicos também vão se dividir entre Serra e Dilma.

A Assembléia de Deus vai apoiar o Serra…
A Assembléia tem dois braços, a de Belém e a de Madureira. A que está apoiando o Serra é a de Belém, Belenzinho que é aqui em São Paulo. O grupo evangélico é muito heterogêneo, é muito plural e muito competitivo internamente. Até essa coisa da Assembléia de Deus apoiar o Serra… Eu acho que tem a questão local, porque a sede dela está em São Paulo, mas tem também essa questão de se diferenciar da Universal, marcar uma posição.

E porque você acha que os candidatos tem certa dificuldade em assumir sua própria fé? A Marina é evangélica mas evita falar. A Dilma demorou a dizer que era católica…
O imaginário brasileiro tem uma valorização muito grande da fé e da religiosidade. Então a nossa elite política não assume explicitamente as suas posições por medo de perder voto. O Fernando Henrique disse que ele era ateu e perdeu voto. Nesse sentido, você se dizer ateu ou se dizer mesmo evangélico é complicado. São razões diferentes. Porque a Marina não pode dizer que é pentecostal? Porque pentecostalismo é, de uma certa forma, muito desvalorizado porque está associado a um certo fanatismo, a uma crítica de proselitismo. Está associado a grupos mais populares. Alguém que quer ser Presidente da República tem que ir além destas amarras religiosas.

Esse jogo de apoio de uma igreja a um determinado candidato é uma questão mais política que de fé?
Sim, mas aí você tem que ver que são dois níveis diferentes. Uma coisa é o fiel e outra coisa é o apoio da igreja. Quando você pensa o fiel, você tem que ver quais são seus valores, como ele vê o mundo, quais são suas representações. É diferente dos olhos de uma instituição religiosa. Aí você tem alguns compromissos que são assumidos, é uma troca de favores. Alguns interesses mais claros, concessões de TV e de rádio, certo controle sobre investigações da Polícia Federal… Você pode botar na mesa vários temas.